sábado, 1 de dezembro de 2007

O Pintor

Aqui no Ceará, as pessoas do interior, das cidades mais isoladas que se pode imaginar, têm mais medo de lobisomem do que eu de assalto. Muitos acreditam mesmo. Eu já conheci um porteiro que jurava que tinha trabalhado para um fazendeiro que tinha estranhas feições lupinas e que sumia em noite de lua cheia. Esse diálogo aconteceu já faz alguns anos e foi meu irmão quem me contou. Tínhamos chamado um rapaz pra pintar a casa e ele costumava contar sobre a vida no interior.

- ... e onça, e cobra, e disco voador... Pra dormir no mei dos mato o neguim tem que ser macho. É um breu medonho que você num conta os dedo.

- E de que é que o senhor tinha mais medo?

- De lobisomem.

- Lobisomem?

- É, meu fi. No meu interior é só o que tem.

- E o senhor já viu um?

- Ora se não! (dicionário de Cearês: ora se não = sim, mas é claro) Nós saía era muito pra caçar. Vi uma vez, quando eu tinha a tua idade. Pense num bicho fei do diacho! Quando eu dei fé era aquela sombra correndo pra riba d´eu. Metemo bala, eu mais o cumpádi e o Chiquim. O bicho soltou um grito de gelar os couro e se embrenhou nos mato. Fiquemo uma semana sem dormir. Outra coisa que eu vi muito foi perna cabeluda. Com aquele olho no joelho e soltando fogo.

- Eita, mas o senhor acredita em tudo que é monstro, hein?

- Tudo não! Se tem uma coisa que eu não engulo é história de dinossauro. Num tem quem me faça acreditar nuns calango de dez metro de altura comendo os outro.

2 comentários:

Anônimo disse...

Simplesmente genial, esse pintor é um ser humano autêntico. Por que digo isso? Por que as eras passadas ignoravam os dinossauros e nem por isso deixaram de ser gente e ter sentido. NÃO é entretanto uma apologia da ignorância, só um lembrete de que a vida já teve menos coisas.

Leonardo Torres disse...

pois é. o pintor e o assistente dele ficaram rindo de mim porque eu acreditava em dinossauros.