segunda-feira, 10 de agosto de 2009

domingo, 29 de março de 2009

João Gilberto - Pra que discutir com madame?

Bossa nova é isso. Digamos que uma canção pode ser destrinchada nos seguintes elementos: melodia, harmonia, ritmo e letra. 

Na bossa nova eles são trabalhados de um modo muito específico. A letra é sempre simples, leve, quase infantil. A melodia segue a mesma idéia, com a diferênça de que a simplicidade aqui é apenas aparente, especialmente naquelas canções compostas com o propósito de ser bossa nova (outras canções, como a do vídeo acima, são sambas mais antigos, transformados em bossa pelo João Gilberto). Sim, porque compositores como Roberto Menescal, Carlos Lyra e especialmente Tom Jobim eram capazes de escrever melodias altamente elaboradas e sofisticadas mas que se disfarçavam de simples. 

É no ritmo que começam as mudanças: a batida do violão sintetiza, no polegar, o surdo do samba, com uma marcação constante nos tempos fortes; e os outros dedos (João às vezes usa o dedo mínimo) simulam o tamborim, com uma marcação muito rica, geralmente ressaltando os contratempos. Além disso, o ritmo do canto também é trabalhado. Algumas frases começam antes do previsto, outras depois. Algumas palavras são esticadas, outras suprimidas. No caso do João, reparem que até mesmo a respiração é usada com efeito rítmico.

Na harmonia, por fim, a bossa nova abre mais espaço para a criatividade do compositor ou do intérprete. O que antes era um acorde, se desmembra em dois ou quatro. As dissonâncias são exploradas matematicamente, favorecidas pela clareza da batida.

Dizer que bossa nova é "elitista" é uma das maiores idiotices que se pode cometer. É uma inversão de valores impressionante. Para uma música ser válida ela tem que nascer na poberza? E o mais importante: tem que ser ruim?

Há alguns anos ouvi o Caetano Veloso criticanto quem não gostava de funk. Disse que era preconceito. Quer dizer que agora eu tenho que gostar de qualquer coisa que venha da favela? E se eu não gostar é preconceito? Eu não gosto de funk por uma série de razões e nenhuma delas tem a ver com a classe social onde ele surgiu. A pobreza que me incomoda no funk é a musical e a poética. 

Da mesma forma o fato da bossa nova ter germinado na classe média não pode me fazer associar a música a essa classe. A bossa nova não tem culpa de ter sido apreciada nos Estados Unidos. Se fosse assim os méritos de um determinado estilo musical não seriam mais musicais. Bastaria a gente saber de onde ela veio, aonde ela foi e a quem ela agrada. Os americanos gostam? O compositor é rico? A música toca em bistrôs? É "elitista" e pronto! 

Eu lembro que, no colégio, quando me perguntavam qual meu estilo musical favorito e eu dizia que era música erudita, eu quase tinha que pedir desculpa! Meus caros, enquanto existir gente pensando assim, a gente vai ter que gostar de funk sob pena de ser taxado de preconceituoso. E quem gosta de música clássica, de jazz ou de bossa nova vai ter que ter vergonha disso.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Novamente Nelson Freire

É o maior pianista brasileiro. No vídeo acima ele tinha 21 anos e estava começando sua carreira internacional. Tocar essa peça deve ser um inferno, mas ele parece não saber disso.
Os grandes pianistas do mundo o admiram, Martha Argerich disse que o primeiro grande susto que tomou foi quando viu ele tocar. Tomem um susto com esse singelo estudo de Mozkowski.
Cliquem no vídeo duas vezes para entrar diretamente no YouTube e ler os comentários babantes.

Valentina Lisitsa toca Rachmaninoff

Uma das críticas mais comuns que se fazem a pianistas da nova geração é: "Fulano é técnico demais, toca tudo muito rápido e sem sentimento". Às vezes isso é verdade, mas é meio ridículo falar um negócio desses. Esse estudo de Rachmaninoff é perfeito para um pianista exibir técnica sem se preocupar em fingir que possui um dom maravilhoso de fazer as pessoas chorarem.
A música para piano de Rachmaninoff é de lascar. Tocar esse estudo é definitivamente um ato de suicídio. E dos mais violentos.
Reparem nessa bruxa loura tocando. Bruxa no bom sentido. Loura também. Dá vontade de dizer "arre égua".

Clair De Lune

Vejam que beleza. Uma cena excluída do filme Fantasia, da Disney. Falem o que quiserem da Disney e do capitalismo americano, mas esse vídeo é o cúmulo da delicadeza. A música é Clair de Lune, da Suite Bergamasque de Debussy, orquestrada pelo maestro Leopold Stokowski.

O que não é arte

Cena 1:


Sarah está caída e indefesa. O vilão aponta uma arma, faz uma piadinha final e dá uma risada macabra. A câmera dá um close nos olhos dele, outro nos olhos dela. A música cresce, a tensão aumenta até que se ouve um estampido – PEI... E o vilão cai morto. É quando descobrimos que o tiro veio de Jack, o mocinho, que até então todos acreditavam estar morto.


Cena 2:


Você está num teatro. O ator está num monólogo desenfreado, a cada P e B ele cospe um litro de saliva. Sua voz vai aumentando, seu rosto ficando vermelho, a veia no seu pescoço parece que vai saltar... Então ele pára. Estende a mão para a frente, como se quisesse alcançar uma coisa imaginária e continua a falar, mas agora sussurrando, como se toda a sua raiva tivesse se dissipado.


Cena 3:


Você está num show. Chega o momento do solo de guitarra do famoso fulano de tal. Ele desfila suas notinhas com uma destreza invejável, sua mão passeia como um camundongo pelas cordas. Num dado momento ele começa a repetir uma seqüência de notas enlouquecidamente. Repete aquela frasezinha uma, duas, três, dez vezes. E o público começa a aplaudir, só parando quando ele segue em frente.


Se você, meu caro amigo, nunca viu pelo menos uma dessas cenas, você deve ser de outro planeta. As três cenas contêm o grande pilar da indústria da arte e do entretenimento: bem vindos ao maravilhoso mundo da previsibilidade.


A grande sacada de quem tem uma carreira comercialmente bem sucedida é essa. Eles entenderam que o público precisa ter a sensação de que conseguiu prever o desfecho daquela cena, a próxima nota daquela música etc.


O prazer em escutar música está diretamente ligado à capacidade que um cidadão tem de antever os próximos compassos. Funciona assim: todos nós, mesmo os que não são músicos, temos um vocabulário musical interno. Mesmo que não saibamos o nome da próxima nota, sabemos qual ela deve ser. Isso porque desde crianças nós fomos interiorizando a linguagem musical. Quando a música foge dessa zona de conforto, sentenciamos logo: é feia. É por isso que a maioria das pessoas gosta de músicas “grudentas”, com um refrão fácil. Essas músicas são mais previsíveis. Ou será que quando você ouve uma canção sertaneja-romântica ou uma balada pop você não se pergunta: eu já ouvi isso antes? Ouviu. Com outra letra, em outro ritmo, com outros instrumentos, mas as idéias musicais utilizadas são sempre as mesmas.


Agora entra uma questão delicada, e eu lhes peço que não interpretem mal. É que quem gosta de música erudita, geralmente adquire um ouvido mais apurado. Não estou falando do ouvinte ocasional, aquele que acha linda a “musiquinha do gás”, mas aquele que escuta com curiosidade e que se propõe a se concentrar naquilo. Cientificamente falando, eles desenvolvem um tipo de memória de curto prazo que lhes permite identificar padrões menos óbvios. O prazer advém da mesma coisa, identificar padrões, mas a música clássica exige mais do ouvinte.


O mesmo se pode dizer de quem lê muito ou de quem admira o cinema não comercial. Estas pessoas tentam escapar do previsível e acabam tendo uma atividade cerebral mais saudável naquele momento. Isso não quer dizer que sejam mais inteligentes do que outras. Eu mesmo conheço muito imbecil que gosta de música clássica e muita gente boa que se satisfaz em assistir “Transformers”. Mas é bom que nós saibamos a diferença entre arte criativa e arte comercial. Se permitirmos que a arte comercial se sobreponha, vamos acabar minando nosso senso crítico, e vamos acabar eliminando os artistas que tentam produzir um conteúdo mais complexo.


Se quiser saber mais sobre o assunto leia o livro Música, Cérebro e Êxtase (Como a música captura nossa imaginação), de Robert Jourdain.

sexta-feira, 13 de março de 2009

A música mansa e artesanal dos Argonautas

A música popular brasileira sempre foi uma das mais interessantes do mundo. Criativa, variada, sofisticada, muitas vezes genial. Meu grupo, Argonautas, estudou e reverenciou isso. Nossa música tenta ter o máximo de honestidade que se pode ter. É música mansa e artesanal. Não é pretensiosa, não usamos a sofisticação e a técnica para transformar canções em manifestos ou em objetos de exposição em salões. Usamos a sofisticação e a técnica quando a música precisa. Se um determinado acorde precisar ter quinze notas, ele terá. Se bastarem três, ficam as três. É isso que eu quero dizer com honestidade.
Somos essencialmente compositores, mais do que instrumentistas e cantores. Ouça, amigo leitor, algumas dessas músicas e me diga se não são honestas. Mesmo que você não goste do estilo, diga que entendeu por que ela é mansa, e qual é o trabalho artesanal nela contido. Ouça o maracatu Cataventos, a marchinha Carolina, a canção Lembranças... Se gostar, conte para todos. Algumas portas se fecham para nós, então a internet ainda é o meio que nós temos de fazer as pessoas saberem de nossa existência.
É um post propaganda de mim mesmo, mas só porque eu acho que o que nós temos a mostrar não é um vídeo engraçado, uma celebridade sem calcinha ou uma lista qualquer. O que nós temos a mostrar é nossa música, e esperamos que vocês gostem.

O recomeço

Em 2007 iniciei a primeira fase deste blog. Esperimentei falar sobre algumas coisas, compartilhar arte e vida com os leitores. Só não tinha leitores. Por culpa exclusivamente minha. Não me esforcei em criar links com outros blogs, em divulgar. Mas agora entra em operação a fase 2. A Revista Til vai dominar o mundo. Vou dar continuidade aos textos e iniciar um plano de divulgação sutil mas constante. Aguardem, senhoras e senhores. Vocês ainda ouvirão falar na Revista Til e nos Argonautas.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Argonautas tocam Tom Jobim - Surf Board

Uma música instrumental do Tom Jobim, também do show "Argonautas Convidam", em julho de 2007.

Argonautas e Fhátima Santos - A Voz do Morro

Show "Argonautas Convidam", que fizemos em julho de 2007. Convidamos a Fhátima Santos para cantar "A Voz do Morro", de Zé Keti, com a gente. Essa mulher canta tanto que estremece o teatro.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Bach - Toccata e Fuga BWV 565 - Karl Richter

A Tocata e Fuga em Ré menor é uma peça batida. A "músiquinha do Fantasma da Ópera". Mas senhoras e senhores, isso é Bach, talvez o maior compositor da história. E esta peça é tão genial que você pode passar 10 anos escutando apenas ela sem se cansar.
A Tocata, uma forma de composição bem livre, é dramática e solene, com pausas de efeito e cores eloqüentes.
Já a Fuga (que começa aos 3 min. e 11 seg.) é o oposto, absolutamente técnica e complexa, mas com uma atmosfera até mais leve.
O órgão é um instrumento poderoso, complicado e belo. Nesse caso tem 4 teclados e mais o pedal, que faz os sons mais graves. No começo vocês não vão entender o cidadão prostado ao lado do organista, mas ele cuida das válvulas que modificam o trimbre do instrumento. Profissão inglória:

- O que é que o senhor faz?

- Eu manipulo o órgão de Herr Richter.


Ainda sobre Stockhausen

Flo Meneses é um compositor que dispensa apresentações. Não porque ele é muito famoso, mas porque ele mesmo costuma se apresentar. O cara é o maior fã dele mesmo. Ele escreveu sobre a morte do Stockhausen e conseguiu falar mais sobre si mesmo do que sobre o morto.
É um cara radical, pelo que eu ouvi falar. Daqueles vanguardistas que simplesmente invalidam qualquer coisa que seja contra sua opinião. Nesse texto dá pra ter uma idéia disso, ele sugere que o que não é de vanguarda, é retrógrado e medíocre. Assim é muito bom! Se você não gostar da música do cara, você é idiota! Mas ele é um compositor completo, sua formação musical deve ser impecável, é com as suas opiniões sobre estética da arte que eu não concordo. Pelo menos com o que li e ouvi até agora.
Bom, eu ainda vou escrever um artigo mais esclarecedor das minhas opiniões sobre vanguarda e modernidade, mas por enquanto dêem uma olhada no texto. É curtinho.

http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2937,1.shl

Psicologia

Psicólogo de colégio é uma coisa engraçada. Eles entram na sala de aula no começo do ano e fazem aquele discurso clássico:
"Eu quero que vocês fiquem sabendo que para qualquer problema que tiverem, vocês têm um amigo aqui que pode lhes ajudar."
Uma vez meu irmão me contou de uma que foi falar para a turma dele. Mesmo discurso, aquela tentativa de desmitificar a profissão e ao mesmo tempo de ganhar a cumplicidade dos alunos. Lá pelas tantas ela soltou uma frase inesquecível:
"... porque psicólogo não é médico de doido. Médico de doido é psiquiatra."

sábado, 8 de dezembro de 2007

Stockhausen

Bom, como esta revista se dedica especialmente à música, ficaria chato eu não mencionar a morte do compositor Karlheinz Stockhausen. É que eu não me sinto atraído pela música de vanguarda. Aliás, minha personalidade rejeita qualquer tipo de vanguarda. Eu não consigo me livrar da impressão de que muito do experimentalismo que se faz é vazio.
Mas magnífico Rafael, você não estuda composição? Como é que alguém estuda composição sem estudar Stockhausen?
Eu não disse que não vou estudar isso. Mas meu interesse musical morre onde os compositores começam a colocar a música em segundo plano. Quando o cara faz uma peça para quarteto de cordas e helicópteros, isso não me atrai. É engraçado, é "doidinho", é "moderno", é "cabeça", mas tem significado? Para mim não. Se tem para você, tudo bem. É que eu já vi muita gente esculhambar Beethoven, desprezar Bach e dizer que música só é música quando "desconstrói" ou sei lá o quê. Stravinsky e Bartók desconstruiram, mas com cuidado. Tiraram alguns tijolos e fizeram seus prédios em cima. Isso me convence. Mas deixar tudo em ruínas e tacar helicópteros em cima, não.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Beatriz - Monica Salmaso e Pau Brasil

Mônica Salmaso é uma cantora impressionante. Ela cantando Beatriz (Edu Lobo e Chico Buarque) é a coisa mais perfeita desse mundo. Pega você pela mão e lhe leva ao sétimo céu. E eu descobri como é que ela faz isso. É que ela tem uma glândula especial que produz doce de leite nas cordas vocais. Assim, também, até eu!

Arvo Pärt - Silouans Song

Um pouco da música do Arvo Part. Tudo bem, quando o cara faz música assim, com esses acordes, essas cores escuras, esse tom triste, é fácil a gente dizer que aquilo é profundo. Mas nesse caso é mesmo. É música minimalista, mas é um minimalismo interessante, que não se pauta na repetitividade, mas na economia de recursos, simplesmente.
Eu escolhi um exemplo só de áudio, que é pra vocês escutarem de olhos fechados... Mentira, é porque eu não achei um com vídeo. Mas vejam que beleza.

Riga


Uma história curiosa: um dia eu estava jantando e o nome “Riga” me veio à cabeça. Eu nunca tinha pronunciado esse nome, não sabia sequer onde o tinha escutado. Mas de algum modo sabia que era uma cidade e que era linda. Pois foi na Wikipedia que eu descobri que Riga era a capital de um país báltico: a Letônia. Fiquei obcecado por Riga, vi fotos da cidade, desejei conhecê-la como nunca havia desejado conhecer uma (e ainda desejo).

Agora voltamos no tempo, possivelmente uns oito anos atrás. Estava eu na Desafinado (uma loja de discos) quando vi o CD do violinista Gidon Kremer. O disco se chamava “From My Home: Music From the Baltic Countries” e a capa era uma bicicleta em uma praia báltica. A praia era desolada e a bicicleta, triste. Como tristeza é comigo mesmo, comprei o disco, num ato de bravura não inédito (era caríssimo). Desde então “Báltico” pra mim é uma palavra mágica. Pois bem, nesse disco, uma das obras que mais me chamaram a atenção foi “Fratres” de um sujeito estoniano chamado Arvo Pärt.

Voltamos a novembro de 2005. Eu estava em São Paulo e no auge do meu entusiasmo por Riga. Como passava o dia fazendo coisa nenhuma, ficava no computador baixando música no Lime Wire. Foi quando a mesma vozinha (de voz, não de vó!) que me fez comprar o disco oito anos antes e que me sussurrou o nome “Riga” em um jantar começou a murmurar “Arvo Pärt”... No Lime Wire descobri dezenas de obras do cara. Ele segue uma corrente que alguns chamam de “minimalismo sacro”, com referências profundamente religiosas. Trata-se de uma obra altamente acessível, fácil de gostar, mas isso não a torna banal, há uma profundidade ali com que os outros minimalistas nem sonham.

Agora digam-me: é ou não é uma coisa fantástica? Isso de eu do nada sentir uma curiosidade que me leva a uma região do globo que nada tem a ver com a nossa? E a um compositor desta mesma região que misticamente está ligado a mim, mas com motivações tão distintas das minhas? Só sei de uma coisa: eu ainda irei a Riga.

E bunda de anjo, pode?


Minha mãe tinha uma coleção de livros de bolso da Editora Abril, cada um dedicado a um pintor. Tinha uma biografia e muitas obras comentadas. Depois de ler, fiquei com a impressão de que a história da pintura passava direto do barroco para o modernismo. Ao contrário da música, que tem um número impressionante de representantes no século XIX, na pintura eu só ouvia falar de Goya e Delacroix.
Mas um dia minha mãe me pediu para descobrir quem era o pintor da imagem da capa de uma Veja antiga. A revista não fazia nenhuma referência à autoria da obra. Depois de um tempo, graças às minhas incríveis habilidades investigativas, acabei descobrindo o nome do danado. William-Adolphe Bouguereau, um artista acadêmico francês. É dele essa pintura aí ao lado. E também essa, que eu coloquei no painel da capa do blog.
É impressionante a sutileza do trabalho desse artista, ele sozinho já colocaria a pintura romântica no mapa. Mas ele não está sozinho. Pesquisando sobre arte acadêmica descobri uma lista de pintores tão geniais quanto ele. Dêem uma olhada, a vida fica mais legal depois disso.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Peraí, deixa eu me explicar

Antes que digam alguma coisa, eu não tenho pena de quem gosta da Madonna, foi o calor da discussão. Eu acho que a música erudita, ou mesmo a música brasileira tem dimensões que o Pop não atinge e nem quer atingir. O ideal seria que tentássemos, ao menos em alguns momentos buscar essas dimensões.
Ou não, ninguém tem obrigação de gostar de nada, talvez o que você busque em música seja simplesmente diversão, distração, balanço, e eu não vejo nada de errado nisso. Mas se você é assim, tente, às vezes, dedicar um pouco do seu tempo a uma música mais reflexiva, isso faz bem. E não me venha com essa de "eu não tenho conhecimento suficiente para apreciar isso". Não tem que entender, basta ouvir. Se não gostar, ouça outra, são 700 anos de história que a gente encontra facilmente na própria intenet. Também se não quiser, não escute, ora!
É que eu tenho esse impulso de divulgar. Sabe quando você lê um livro e acha tão bom que quer que todos os seus amigos o leiam? Na música erudita tem coisas que me impressionam tanto que eu quero que toda a humanindade conheça. Com algumas excessões...

O Dilema

Mestre Rafael, você não falou que ia ter mulher pelada nessa droga? Cadê???!!! Pois meus amigos, vocês não sabem. Vejam como é a vida. Tenho um grande amigo que recentemente se voltou ao catolicismo. Ele é formado em jornalismo e escreve muito bem, nossas conversas sempre rendem frutos para um e para outro. Pois pedi que ele se tornasse colaborador da revista, o que no princípio ele aceitou com entusiasmo. Acontece que junto com o primeiro texto ele me manda o seguinte e-mail:

"Meu caríssimo Rafael
Envio o texto como prometido, mas te faço um apelo. Espero que entenda que se trata de uma questão de consciência. Eu não posso participar da Til se ela publicar imagens eróticas. Peço sua compreensão como acho que nunca pedi. Por favor, não entenda isto como uma censura ou uma pregação. Mas se eu fizer isso, eu teria que me acusar num confessionário, pois colaborei com uma proposta sobre a qual minha consciência discorda da correção.
Faço um humilde apelo de que homenageemos a mulher com imagens de moças bonitas vestidas, que na net não faltam (...) se eu creio firmemente num criador ao qual presto contas e a quem não posso ofender, a mão se recusa a ir adiante e a vontade deve ceder.
Sei que isso te obrigaria a mudar um plano original e ferir o plano editorial de tua revista. Se não for possível atender a meu pedido nem precisa se explicar é só dizer "não" e nossa amizade continua como antes. Sei que você deve levar as mão à cabeça agora: "por que a vida é tão difícil!"
Abaixo vai minha contribuição. Julgue se vale a pena..."

Minha resposta:

"Meu caro, estou pensando na sua proposta. Confesso que quando li seu e-mail achei graça. Não por deboche, mas por julgar que a questão era mais simples do que você parecia achar. Quebrei minha cara. Ela foi adquirindo proporções monstruosas na minha cabeça. Eu tô até assustado!
Por um lado não me custaria nada simplesmente não postar mulheres nuas. Ou melhor, fotos. Postar mulheres nuas ainda não é possível. Mas por outro eu começo a pensar coisas. Trata-se de uma questão pessoal sua que eu compreendo perfeitamente. Mas eu não posso abraçar a sua causa. Simplesmente porque não faz o menor sentido pra mim.
Vamos entrar um pouco na velha conversa sobre isso ser ou não uma exploração leviana do corpo feminino. Uma foto de um inseto ou do Cristo Redentor é o quê? Uma exploração? Por quê? Porque eles não tem como se defender da exposição? Mas se defender de quê? Para mim o corpo feminino e a estátua têm o mesmo valor estético (tá, confesso, tenho minhas preferências). A imagem de uma mulher nua não me levanta questionamentos, não me traz nenhuma carga moral. Pode até trazer dependendo do caso, mas a imagem de um trator também pode. Depois de meia hora de discussão concordaríamos que aquilo instiga o homem para o ato sexual. Mas e aí? O sexo não tem também valor moral negativo pra mim. Não tem nada de errado. Pelo menos entre dois adultos.
Aceito que você me dê esse ultimato como espero que você aceite minha resposta. Mas eu sempre achei que o ultimato tem algo errado. Não se trata de uma simplificação do ditado “os incomodados que se retirem”. Se os incomodados têm um bom argumento, sua opinião deve prevalecer e os “incomodadores” é que têm que se retirar. Mas você sabe que pra mim o seu argumento não serve. Serve pra ti, Helder. Tu pode até acreditar que essa é a grande verdade divina e olhar para mim com a mesma pena com que eu olho pra um fã da Madonna, mas eu sinto que posso explicar concretamente os motivos pelos quais a música que eu admiro é melhor que a dela. E posso explicar sem pedir para a pessoa simplesmente acreditar em mim. Sem pedir pra ela simplesmente aceitar aquilo. E sem dizer a ela que se ela não acreditar é porque lhe falta alguma grande compreensão da sua própria dimensão interna e da natureza do universo. Eu posso mostrar com as mãos, com os dedos, com uma folha de papel.
E aí tem outra questão. Se você não gosta não olhe! Você sempre vai ter essa opção. Você não está escrevendo sobre aquilo e nem divulgando. Seria como sair de um cinema porque tem um casal se esfregando lá dentro. Você poderia, teoricamente, conviver com isso sem se sentir tentado a olhar, mas não pode obrigar os outros a lhe seguir. Enfim, a minha atitude lhe dá liberdade, enquanto a sua me gera obstáculos. Pois lembre-se que as fotos serão pautadas pela qualidade plástica, não pela dose de erotismo. O vulgar não terá vez, e o erótico deixará de ser erótico.
Não me custa nada aceitar isso, mas se tu começar a fazer essas coisas, daqui a pouco vai dizer que tem que se desligar de mim pelo simples fato de eu manter relações sexuais sem propósitos reprodutivos. Você dirá que é aí que entra o bom senso, que você jamais faria isso e tal. Mas se você pensar bem a questão é a mesma.
Enfim, é uma discussão estéril. Isso nunca vai a lugar nenhum, mas por enquanto temos um problema prático nas mãos. Uma escolha. Cedo eu ou cede você. Um religioso que se preze jamais cede, lógico, o que deixa a decisão toda pra mim.
Ainda estou pensando, confesso que meio perdido. Mas vamos com calma que tudo se ajeita. Só o que me importa é saber que qualquer que seja a minha decisão a nossa amizade continuará intacta. Com isso eu posso contar, não é?

Grande abraço e que a luz caia sobre nós.

Rafa"

Perguntei a ele se poderia publicar os e-mails, pois acho que geram um bom debate. Ele autorizou. Contanto que eu não publique foto de mulher pelada.
Não perca os próximos capítulos desta dramática novela e veja qual será minha decisão.

Argonautas

Estes são os Argonautas. Eu no centro, Ayrton Pessoa no acordeom e Leonardo Torres no piano. Clique aqui e veja alguns exemplos de músicas do grupo.

Quem é Alan Mendonça

Quem é Alan Mendonça? É esse aqui, ora:

Margarida Flor

Será que o amor é uma ave viajante?

As águas de um rio, uma vazante?

Pode o amor se fazer brincante?

Ou será que o amor só é amor se for distante?


Será que o amor é um cavaleiro andante?

Será que o amor partiu numa volante?

Será que o amor se amarra num barbante?

Será que o amor é pequeno ou é gigante?


O amor suplica ou grita feito algum mandante?

Será que o amor dura muito no durante?

Pode o amor não ter corpo nem semblante?

Pode o amor aparecer e sumir cintilante?

Alan Mendonça


Alan Mendonça é um poeta cearense que tem muito a ver com a identidade dos Argonautas. Ele esteve presente desde a criação do grupo e a sua poesia nos ajudou a criar nossa identidade artística. O poema acima foi musicado pelo Ayrton Pessoa, assim que der eu mostro pra vocês. A música, não o Ayrton.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Ravel 4 - Daphnis et Chloé

Não dá pra falar de Ravel sem mencionar sua orquestração. A maneira como ele trata os instrumentos individualmente e como ele trabalha as infinitas combinações, criando massas sonoras inigualáveis, tornaram-no uma verdadeira lenda.
Se escutarmos apenas as flautas ou os violinos, a peça não faz sentido. É quando juntamos todos os instrumentos que ocorre a mágica.
Essa peça, que é o parte do balé Daphnis et Chloé descreve uma alvorada. Mas é a alvorada mais bonita que eu já vi. Vladimir Ashkenazy regendo a Orquestra Sinfônica NHK, do Japão.

Ravel 3 - La Valse (parte 2 de 2)

Aqui a parte final de La Valse. Nelson Freire e Martha Argerich, que conhecem a peça até de trás pra frente.

Ravel 3 - La Valse (parte 1 de 2)

La Valse descreve um baile, é uma homenagem de Ravel às valsas de Johan Strauss. Ela começa do silêncio, caótica, como uma memória antiga, e aos poucos vai ganhando corpo. À medida que progride, vai sendo tomada de um frenesi, uma selvageria que nunca cessa. Se música pode ser pungente, aqui está um exemplo acabado.

Ravel-Gaspard De La Nuit - Argerich 1/3

Já que falei de Ravel, vou mostrar um pouco mais dele. Esse vídeo mostra a genial Martha Argerich tocando Ondine, o primeiro movimento de Gaspard de la Nuit.
É uma obra impressionante! Vai muito além da simplicidade obsessiva do Bolero. Reparem na escrita para piano. É música insubstancial, feita não de notas, mas de fumaça. Ele faz uma referência à água passando por um riacho, com suas pequenas cascatas. Esse efeito, que muitos chamaram de 'impressionista' só pode ser atingido por um compositor muito familiarizado com o piano. E só pode ser tocada com tanta delicadeza por um pianista muito familiarizado com a obra de Ravel.